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Shady e a mudança climática: a última aventura da famosa arqueóloga
Shady e a mudança climática: a última aventura da famosa arqueóloga / foto: Cris BOURONCLE - AFP

Shady e a mudança climática: a última aventura da famosa arqueóloga

Como o Indiana Jones de Hollywood, Ruth Shady não se aposenta. Depois de revelar ao mundo a civilização mais antiga da América, a arqueóloga peruana de 76 anos vai atrás dos vestígios de uma catástrofe: a da mudança climática na antiguidade.

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Sem o apoio estatal que desejava e com algumas ameaças de morte no caminho, Shady, uma das arqueólogas mais respeitadas do mundo, voltou a Vichama, Peru, depois de sobreviver à pandemia.

Lidera uma expedição que rastreia os estragos que abatem a humanidade diante da crise climática contemporânea.

A 156km ao norte de Lima, no distrito litorâneo de Végueta, o sítio arqueológico Vichama "é de relevância para o presente (...) Seus elementos arquitetônicos explicam com precisão todo o processo que a mudança climática significou para a humanidade", explica Shady.

Vichama é um dos 12 centros urbanos que formam o complexo arqueológico de 5.000 anos descoberto por ela no final do século passado.

A cientista rebatizou como Caral o que era conhecido como Chupacigarro, um platô com montes áridos, cercado por colinas e com um rio que o separa dos vales.

Levada pela curiosidade que lhe foi transmitida por seu pai, um professor checo que conseguiu fugir da Gestapo na Segunda Guerra Mundial, chegou a este local com seus estudantes em um fusca Volkswagen.

Com a ajuda da National Geographic, lançou-se em sua maior aventura. Sob toneladas de solo arenoso, encontrou pirâmides com topos achatados e uma surpreendente arquitetura antissísmica.

Caral terminou sendo reconhecida como a civilização mais remota da América e uma das mais antigas do mundo junto das da Mesopotâmia, Egito, China, Índia e Creta.

- Um colapso natural -

Shady, uma das 100 mulheres mais inspiradoras do mundo, segundo a rede britânica BBC, move-se a passos lentos pelas ruínas de Vichama rodeada por dois arqueólogos.

Esta área de 25 hectares, que os indígenas quechuas chamavam de Uichma (pescador), atesta o colapso de Caral pela seca e fome.

Das paredes, com suas gravuras de figuras humanas cadavéricas, ou com o estômago vazio, aos frisos e seus sapos antropomórficos, aqui tudo fala, susurram os arqueólogos.

Há 3.800 anos, os habitantes do que hoje se conhece como Peru enfrentaram um evento natural de grande magnitude, o qual, diferentemente da crise climática atual, não estava associado à atividade humana.

"Os vales foram convertidos em oásis, em desertos arenosos. Os rios desapareceram e, progressivamente, esse grande fenômeno natural ocorreu", explica Shady.

Entre as gravuras das paredes, pode-se observar a de um sapo com os braços estendidos e uma cabeça humana com os olhos fechados.

Segundo Shady, a imagem representaria o anúncio da chegada da água após uma devastadora seca. Na cosmovisão andina, o sapo é relacionada às chuvas e aos rios.

Um evento climático de "repercussão mundial" e de características cíclicas atingiu a humanidade há milhares de anos. Caral colapsa e dá lugar a Vichama, explica o arqueólogo Aldemar Crispín.

"Eles passaram por uma mudança climática muito forte que ficou representada nos muros", acrescenta.

- Guardiã, sob ameaça -

Shady passou mais de 25 anos escavando nos 66 hectares que formam as ruínas de Caral, uma civilização que se levantou sem muros nem armas e que desenvolveu uma arquitetura resistente em uma região de alta atividade sísmica.

Em 2009, a Unesco declarou Caral patrimônio da humanidade. As terras férteis ao redor da cidade sagrada se valorizaram e começaram as invasões estimuladas por traficantes de terra.

Apesar de, na teoria, serem terrenos do Estado, os invasores não foram despejados. A situação se agravou durante a pandemia. Shady foi intimidada por sua cruzada legal contra as ocupações que ameaçam o sítio arqueológico.

O advogado da guardiã de Caral foi ameaçado: "Se continuar protegendo essa mulher, vamos te enterrar junto dela cinco metros abaixo do chão", recorda a arqueóloga.

"Não temos o apoio do Ministério Público, nem da polícia", nem do Estado em geral, lamenta Shady.

P.Batteux--RTC