RCA Telegram News California - Após voltar de Gaza, médico relata 'tsunami' de dor e de crimes de guerra

Após voltar de Gaza, médico relata 'tsunami' de dor e de crimes de guerra
Após voltar de Gaza, médico relata 'tsunami' de dor e de crimes de guerra / foto: HENRY NICHOLLS - AFP

Após voltar de Gaza, médico relata 'tsunami' de dor e de crimes de guerra

Um médico britânico-palestino descreveu à AFP, em seu retorno de Gaza, um conflito de uma intensidade sem precedentes, esperando que seu depoimento ante a polícia do Reino Unido conduza a um processo por crimes de guerra.

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Ghassan Abu Sitta, cirurgião plástico de 54 anos, especializado em feridas de guerra, passou 43 dias como voluntário em território palestino, principalmente nos hospitais de Al-Ahli e Al-Chiffa, no norte da Faixa de Gaza.

Segundo o médico, a intensidade do conflito supera a de outros nos quais já trabalhou em Gaza, Iraque, Síria, Iêmen e no sul do Líbano.

"É como comparar uma inundação e um tsunami, a magnitude é completamente diferente", explica em uma entrevista à AFP.

Essa guerra supera as outras em que já esteve no "número de feridos", "no número de crianças mortas, na intensidade dos bombardeios e no fato de que nos dias seguintes ao início da guerra, o sistema de saúde de Gaza se encontrou completamente superado", destaca.

A guerra foi provocada pelo ataque sem precedentes do Hamas contra Israel em 7 de outubro, que deixou mais de 1.140 mortos, em sua maioria civis, segundo uma contagem da AFP baseada no balanço israelense. Entre os mortos, há mais de 300 militares.

A ofensiva israelense deixou 22.835 mortos na assediada Faixa de Gaza, em sua maioria civis, sobretudo mulheres e crianças, segundo um último balanço do Hamas.

Os bombardeios destruíram bairros inteiros, obrigaram o deslocamento de 85% da população e provocaram uma crise humanitária, segundo a ONU.

O doutor Abu Sitta, nascido no Kuwait e radicado no Reino Unido desde o final dos anos 1980, chegou a Gaza a partir do Egito em 9 de outubro em uma equipe da ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF).

"Desde que nos instalamos, não tínhamos capacidade suficiente para tratar o número de feridos que chegavam até nós. Toda vez, tínhamos que tomar decisões difíceis e escolher quem tratar", recorda.

O médico menciona o caso de um homem de 40 anos que chegou ao hospital com estilhaços na cabeça. Necessitava de uma tomografia computadorizada e consultar um cirurgião, mas não havia nenhum naquele momento.

"Dissemos isso aos seus filhos e ficaram junto dele naquela noite até que morreu pela manhã", explica.

Os hospitais também ficaram rapidamente sem anestésicos e analgésicos, por isso que o doutor Abu Sitta teve que fazer "limpeza de feridas muito dolorosas" sem possibilidade de um calmante que aliviasse o tratamento.

"Era uma escolha entre isso ou que morressem pela infecção de suas feridas", diz.

- Fósforo branco -

O médico afirma que tratou de queimaduras provocadas por fósforo branco, cujo uso como arma química é proibido pelo direito internacional.

O Líbano acusou Israel de utilizá-lo no conflito.

"O fósforo chega a queimar as partes mais profundas do corpo, até o osso", acrescenta Abu Sitta, que diz ter deixado Gaza, já que a falta de material médico o impedia de operar.

Desde seu retorno ao Reino Unido, diz que passou a maior parte de seu tempo alertando líderes políticos e organizações humanitárias sobre a urgência de uma ajuda a Gaza.

"Tento ajudar o máximo que posso os pacientes que deixei lá levando suas vozes a outros lugares", afirma.

O médico explica que informou à polícia de Londres sobre as feridas das quais foi testemunha, o tipo de armas utilizadas, o uso do fósforo branco e "os ataques contra civis".

Abu Sitta também contou como sobreviveu ao ataque de 17 de outubro ao hospital Al Ahli, que o Hamas atribui a Israel, enquanto os países ocidentais acreditam que foi um foguete defeituoso lançado pelos palestinos.

A Scotland Yard, a Polícia Metropolitana de Londres, destaca que tem a obrigação de recolher provas de possíveis crimes de guerra por parte dos dois lados e eventualmente apresentá-los à Justiça internacional.

"Em última instância", acredita o médico, "a Justiça encontrará essas pessoas, se não for dentro de cinco anos, será dentro de dez, quando tiverem 80 anos, quando o equilíbro de poder no mundo tornar a justiça possível para os palestinos".

P.Johnson--RTC